quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Never Stops

Composição: Bradford Cox


I had dreams
That frightened me awake
I happened to escape
But my escape

would never come
would never come
would never come
would never come

I had plans
To go away for days
To try and risk a pace
That haunts my days

that haunts my days
Haunts my days
Haunts my days
Haunts my days

Ilove

Enter in my heart
It never stops
It never stops

Oh enter
Oh enter
Oh enter
Oh enter

It never stops
It never stops
It never stops
It never stops
It never...

Ahhhhh

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Destination Unknown

Composição: James Iha

Life is so strange
When you don't know
How can you tell
Where you're going to
You can't be sure
Of any situation
Something can change
Then you won't know

You ask yourself
Where do we go from here
This seems so altered here
Just as far beyond as I can see
I still don't know what this all means to me

I have nowhere to go
I don't know what to do
And I don't even know the time of day
I guess it doesn't matter anyway

Life is so strange
Destination unknown
When you don't know
Your destination
Something can change
It's unknown
Then you won't know
Destination unknown

Life is so strange
Destination unknown
When you don't know
Your destination
Something can change
It's unknown
Then you won't know
Destination unknown

When will my time come
Has it all been said and done
I know I'll leave when it's my time to go
Till then I carry on with what I know

Life is so strange
Destination unknown
When you don't know
Your destination
Something can change
It's unknown
Then you won't know
Destination unknown

Life is so strange
Destination unknown
When you don't know
Your destination
Something can change
It's unknown
Then you won't know
Destination unknown

Life is so strange

Religião e Horizonte Utópico em Jovens de Comunidades [AGDL]

Projeto de Iniciação Científica: PIBIC; Teologia, PUC/RJ: 2010.1- 2011.1.

Religião e Horizonte Utópico em Jovens de Comunidades [AGDL]

Projeto de Iniciação Científica: PIBIC; Teologia, PUC/RJ: 2009.2 - 2010.2

Para Luíza [AGDL]

Pretensiosamente afirmo que toda forma afetiva de se relacionar com o outro é cósmica, transcendente e remete a um outro, Totalmente Outro. Somos configurados para não vivermos sós. São em nossas ambiguidades que fazemos essa experiência, experiência na vida, em vida, que é escrita por nós artesãos humanos, enriquecida por adjetivos, verbos, carregados, impregnados de nós mesmos que temos em nossa constituição a beleza de sermos criados e criadores.
Essa reflexão é endereçada a todos os homens e mulheres de “boa vontade”, que na configuração de “imagem e semelhança”, são todos provocados a criar e a reciclar o que nos foi dado, o que nos incumbido individualmente e coletivamente.
Ciclos se findam, ciclos se iniciam numa aspiralada onda, onde os afetos podem trazer razão para a nossa relação cósmica. Afetos que ao longo de nossa caminha, podem ser reciclados, resignificados, até mesmo desabrochados, plenificados.
Somos tudo o que vivenciamos até este exato momento, não devemos nos envergonhar de nossa trajetória, nem de nosso passado, nem de nosso presente. Fico com um provérbio popular que diz: “o futuro a Deus pertence”. A ele pertence e a nós é dada a liberdade, a alteridade de dinamizá-lo, de fazê-lo hoje, algo que traga significado e esperança para os que nos sucederão. É um “já” e um “ainda não”. Um futuro com cheiro de coisa boa, que hoje mesmo exala esse odor fresco.
Que essa novidade, que vem como onda sobre a “Luíza”, possa através de suas mãos, pés, olhos, boca, coração, razão, paixão. Possa nos afetar, possa criar em nós um desejo de maior comprometimento com o outro. Que os órfãos, as viúvas e os estrangeiros citados por homens do passado, possam ser reconfigurados, inseridos, reinseridos em nossa “nova humanidade”, que gera multidões de excluídos. Excluídos pela orientação: sexual, religiosa, política, econômica, artística etc.
Deixo essa conversa poética, afetiva do Filho para a filha Luíza e para todos os filhos e filhas que se identificam com os excluídos, marginalizados e empobrecidos. Finalizo com essa linda oração de Carlos Alberto Rodrigues Alves:

"Prece ao Pai"

PAI, que na paixão maior, no céu eterno nos geraste e nos acalentaste.
ESTÁS NOS CÉU do sol e da lua, do chão e da rua.
SANTIFICADOS sejam teus braços que entre abraços, faz-nos de seres solitários, irmãos solidários.
VENHA A NÓS O TEU REINO presente em nossas saudades e utopias, carentes de afetos e de alegrias.
SEJA FEITA A TUA VONTADE de pai que se apaixona, de carinhosa mãe que se emociona.
O AMOR NOSSO DE CADA DIA, faz-nos viver tão terna e eternamente no corpo, na alma e na mente, dia-a-dia infinitamente.
E NÃO NOS DEIXES CAIR EM TENTAÇÃO de fazer qualquer coisa sem paixão, sem ouvir as razões do coração.
MAS LIVRA-NOS DO MAL da omissão, da apatia e dos desencantos, da opressão, da antipatia e dos horrores tantos.
POIS TEU É O REINO do Bem, do Bom e do que é Belo.
O PODER que dá vida e para a Vida nos convida
E A GLÓRIA, que entre lutas inglórias faz ser Tua nossas histórias
PARA SEMPRE E SEMPRE. 
AMÉM.

Terça, 15 de Fevereiro de 2011.

Monólogo ao pé do ouvido

Composição: Chico Science

Modernizar o passado
É uma evolução musical
Cadê as notas que estavam aqui?
Não preciso delas!
Basta deixar tudo soando bem aos ouvidos
O medo dá origem ao mal
O homem coletivo sente a necessidade de lutar
O orgulho, a arrôgancia, a glória
Enche a imaginação de domínio
São demônios os que destroem o poder
Bravio da humanidade
Viva Zapata!
Viva Sandino!
Viva Zumbi
Antônio conselheiro!
Todos os panteras negras
Lampião sua imagem e semelhança
Eu tenho certeza eles também cantaram um dia.
Há um tempo atrás se falava de bandidos
Há um tempo atrás se falava em solução
Há um tempo atrás se falava e progresso
Há um tempo atrás que eu via televisão
Galeguinho do Coque não tinha medo, não tinha
Não tinha medo da perna cabeluda
Biu do olho verde fazia sexo, fazia
Fazia sexo com seu alicate
Oi sobe morro, ladeira corrego, beco, favela
A polícia atrás deles e eles no rabo dela
Acontece hoje e acontecia no sertão
quando um bando de macaco perseguia Lampião
E o que ele falava outros ainda falam
"Eu carrego comigo: coragem, dinheiro e bala"
Em cada morro uma história diferente
Que a polícia mata gente inocente
E quem era inocente hoje já virou bandido
Pra poder comer um pedaço de pão todo fudido
Banditismo por pura maldade
Banditismo por necessidade
Banditismo por uma questão de classe

Confissão de Fé: Credo Cubano

Creio em Deus, fonte inesgotável de vida; comunidade que vive e nos chama a viver em comunidade infinita de amor. Creio em Deus que, com amor de Pai e Mãe, engendra e dá a luz a este mundo, o amamenta, o protege, o educa e o renova constantemente.
Creio em Jesus de Nazaré, o princípio e o fim; expressão plena da humanidade de Deus.
Creio no Espírito Santo, fonte da unidade; presente onde quer que a vida esteja fluindo.
Creio no ser humano como projeto inacabado de Deus, porém desde já portador de sua verdadeira imagem e semelhança.
Creio que a história é o registro das relações entre Deus e os seres humanos; um diálogo plenamente livre e totalmente aberto ao futuro.
Creio no Reino de Deus como realidade plenificante embora ainda não plena e como utopia que alimenta nossa esperança, movimenta e orienta nossa prática de fé.
Creio na Igreja como pregadora deste Reino. Creio nela como reunião do Povo de Deus; chamada como sal da terra e luz do mundo; a fim de dar-lhe sabor e sentido a existência.
Creio na vida depois da morte como o reencontro feliz da criatura com o Criador na festa final e eterna do Universo. Nisto eu creio. Amém.

domingo, 6 de novembro de 2011

"Nobody's Daughter" - uma leitura teológica [AGDL]


“Masturbação, Café e Teologia” apresenta o último álbum da banda norte-americana “Hole”, onde serão analisadas teologicamente as letras de Courtney Love, relacionando-as ao longa metragem infantil “Cinderella”.

Nobody's Daughter” narra à história de uma pessoa que se encontra num momento de profunda angústia, desespero, solidão, opressão, perda. Nesse itinerário ocorre uma espécie de síntese de sua vida e a possibilidade de transcender a sua atual condição.
Quatro são as personagens que se destacam na narrativa, podemos nomeá-las de: “o opositor”; “a bastarda”; “o Resgatador” e “o amado”. Onde serão analisadas num outro momento, associando-as aos personagens centrais de “Cinderella”.


A narrativa utiliza imagens e reflexões que podem ser lidas, interpretadas numa perspectiva teológica, onde vemos: a personificação do mal - hostil a Deus e inimigo do ser humano; a idéia de um Deus "Go'el" -  resgatador, libertador, protetor (mesmo que questionado em relação a sua ação); um amor repleto de paixão, desespero e sensualidade, podendo ser comparado ao amor narrado em Cântico dos cânticos.
Há frases carregadas de sentido teológico: "Sei que não devo temer, você vai me resgatar. Oh Deus me tire desse lugar"; "Eu não sou a última que seria salva"; "Você nunca verá a luz"; "Rezando para Deus, por alguma salvação"; "Eu apenas espero até que você tenha ressuscitado"; "Por que eu não sou boa o suficiente para te salvar da destruição?"; "Eu viverei para sempre puro, como o primeiro amor, apenas volte para casa"; "Eu me amarro a você com toda a vida que há em mim, eu me amarro a você com toda a esperança que há em mim, eu me amarro a você até que a luz se derrame como mel"; "Eu me rendo, eu me entrego. Eu vou derrubar sua porta se você não me deixar entrar"; "Continue rezando, reze pelas coisas bonitas que você não vai receber de volta"; "Domingo de manhã quando a chuva começa a cair, eu acredito que vi o fim de tudo isso. Domingo de manhã quando a chuva começa a cair eu tenho a cura para tudo isso"; "Eu sei que sou uma menina perdida e esfomeada. Mas, por favor, fique por perto e eu te construirei um mundo"; "Querido Deus, estou escrevendo esta carta para você"; "Sua juventude se foi, tudo está coberto de pó da derrota"; "Eu perdi a cabeça, eu perdi o controle, eu não sinto meus braços, eu sou uma alma perdida"; "E apesar de tudo eu sobrevivi do fogo do inferno, eu estou viva".


De início vemos a “bastarda” se questionar em relação à radicalidade da vida. Ela se encontra em profunda crise existencial tomada por uma enorme dor, angústia, depressão. Parece ser o resto, o lixo mais desprezível da sociedade. A personagem passa por um momento decisivo: enfrentar a morte, a perda de seu maior amor e a possibilidade de criar novas alternativas, diante de si mesma. Há um desejo de plenitude, de eternidade nessa dinâmica.


O “opositor” aparece com todo o seu potencial de destruição, cinismo e mentira. Poderíamos compará-lo a um estuprador de sonhos que se empenha em desfigurar a imagem e ofuscar as virtudes da bastarda.  A decadência, a devassidão, a miséria, o vício, o inferno, a mentira, a ganância, a cobiça, a degeneração é algo intrínseco a sua personalidade.
Em contraposição aparece a figura do “Resgatador”. Na maioria das vezes está associado à vida, a luz, a salvação, a esperança, mesmo que a imagem dEle seja questionada pela bastarda.
Um novo personagem aparece, frente a tantos questionamentos, trazendo uma carga afetiva, nostálgica para a narrativa: “o amado”. Ele na realidade seria uma, ou a maior, inspiração para a vida da bastarda. Ela se agarra nesse amor nostálgico e procura fazer desse evento uma meta, para transcender toda a sua desgraça. O amado tem a sua vida finalizada. A sua falta traz novas perspectivas dentro de um longo processo de destruição e perdas. A bastarda mesmo nesses momentos rememora, relembra a força desse amor. É nessa nostalgia que a narrativa começa a tomar um novo rumo.


Uma recapitulação começa a se dar em sua vida, parece haver um retorno. Surge um lugar simbólico na narrativa, que traz à tona o valor e ressignificação da vida e da morte. Talvez seja no Hawaii esse lugar. Foi nesse lugar que ambos se casaram, e foi nesse vasto oceano que se dá uma profunda reflexão. Esse lugar simbólico refere-se a momentos de alegria que poderiam ter sido intensificados ao lado do amado, há uma enorme confusão, tristeza e arrependimento nesse sentido.


A potencialidade do mal, não se afasta dela, tenta tirá-la desse lugar. Um germe de otimização se manifesta: a personagem tem em suas mãos “a vida e a morte”. Ela se posiciona diante da perda e declara que nem toda a vergonha desse mundo irá detê-la, nem toda a fama, droga, peste irá deter a sua sobrevivência.
Surge a imagem de uma estrela cadente. Ela apelida o amado de “estrela cadente”, parecendo fazer um pedido: rememorar os grandes momentos vividos pelo casal no “Hawaii”, nesse momento simbólico pede que saia viva, restaurada.

     
O opositor é personificado em “Samantha”. Uma mulher que possui uma gama de adjetivos negativos: guerra, devassidão, prostituição, drogadição, morte, estupro, sofrimento etc. Mesmo diante do sarcasmo, da indelicadeza de Samantha a bastarda consegue fazer uma autorreflexão positiva, deseja se libertar rompendo com a força do mal que a persegue constantemente.
A bastarda mesmo diante de tantos sinais se encontra estranha em sua intimidade, se encontra só. A confusão e o medo reaparecem. Num chuvoso dia de domingo chocam-se a fé, a dúvida, a cura e o desespero.
O domingo da bastarda nos remete a um domingo onde duas mulheres experimentaram um frescor. Na Sagrada Escritura o domingo pode significar uma intervenção, uma renovação. Nessa intervenção as trevas, a morte, a solidão, o medo são enfraquecidos, perdem o fôlego diante de um amanhecer ensolarado. Naquele domingo ela se depara com o absurdo de sua vida, encontra-se frente a frente com a sua humanidade repleta de contradições e desejosa por transcendência.


Diante da realidade conjugal vemos, sabemos que nem tudo são rosas, nem todos os momentos são plenos. Comporta a falta de verdade, o desgaste, a ganância, as necessidades intermináveis, as manipulações, as ambiguidades. Mas a bastarda parece apostar seus sonhos e utopias nessa relação. Mas o faz sem perder a singeleza e a crueza. Há um realismo absurdo, desconcertante em suas confissões.
Juras e juras demonstram uma justificativa, uma necessidade sincera, incondicionada e presunçosa diante do amor. Nessa confusão surge o “desespero” de construir algo fundamentado nessa força. Nessa construção a bastarda revela parte de sua intimidade e humanidade.
Do meio para o final do álbum surge uma carta no mínimo curiosa, cujo destinatário é Deus. Essa carta poderá muito nos ajudar a entender o que o teólogo alemão Karl Rahner enfatiza: "são nos momentos existências de consolações e desolações que o ser humano se choca com o Mistério". Quanto mais o ser humano se aprofunda na existência, em questões fundamentais da vida, mais próximo ele está do Mistério. Mistério esse que chamamos, nomeamos de Deus.
Destaco a tradução dessa música, dessa oração com o objetivo de iluminar a proposta desse texto. Nessa oração a bastarda se choca com esse Mistério que encharca, que conduz e penetra tudo, que se distancia de tudo e assume tudo consigo. Ao invocá-lo, ela se encontra consigo, se revela, se liberta através da ação do próprio Mistério. Ela esta diante dEle, sendo distinto dEle imersa em sua própria realidade. Nessa dialética espiritual ela se trans-forma em alguém que participa desse Mistério infinito. Essa experiência é denominada pelos cristãos de Graça.

 

Letter to God / Carta para Deus

Querido Deus estou escrevendo esta carta para você

Pois, não consigo entender...

Você pode me ajudar?

Estou aqui sentada apenas tentando entender

Sobre o significado da minha vida

Você poderia me dizer?

Eu nunca quis ser

A pessoa que você vê

Você pode me dizer quem eu sou?

Eu sempre quis morrer

Mas você me manteve viva

Você pode me dizer quem eu sou?

Eu minto acordada conduzindo esta sinfonia

Que você me presenteou

Mas nunca consigo dormir

Não fique bravo, mas eu me sinto fraca por dentro

E começo a desmoronar

Porque eu não sinto nada

Eu nunca quis ser

Algum tipo de alívio cômico

Por favor, me mostre quem eu sou

Eu fui torturada e desprezada

Desde o dia em que eu nasci

Mas eu não sei quem eu sou

E te agradeço cara, por tudo

Desculpe-me estou tão assustada com tudo isso

Mas eu queria poder te dar mais

E todas as luzes estão brilhando em mim

E eu me sinto intimidada por todas

Eu nunca quis ser a pessoa que você vê

Mas obrigada

Oh Deus, por favor, me diga agora

Você está desapontado?

Você está orgulhoso?

Eu ainda não fiz tudo? Tudo

Desculpe-me sou tão fraca

E eu me tornarei uma aberração

Mas eu não sei nada, nada

Mas eu perdi toda auto-estima

Conforme fui enterrando tudo

E eu não sinto nada, nada

Oh Deus, por favor, me responda agora

Oh Deus, por favor, me responda agora

Porque eu não sinto nada

Querido Deus, estou escrevendo esta carta para você

Estou deslocada

Por favor, me ajude.


O opositor como vimos acima não desiste facilmente de sua vida, mas enfatiza, explicita a sua personalidade, o seu vocabulário recheado de ódio, condenação, destruição, maldição e derrota, pervertendo dessa forma virtudes nobres, como o amor, a fé e a esperança, com o intuito de trazer confusão para uma mente cansada. Muito do que é dito, realmente condiz com a condição vivida pela bastarda. Condiz mas não propõe nenhuma alternativa, pois faz parte de seus planos reduzi-la ao fracasso, a morte e ao esquecimento. 

O sofrimento é analisado por uma nova ótica, parece haver uma “glamorização”. A culpa, o ressentimento e a expiação também ganham ênfase. A impressão é que somente através do sofrimento (conjugado à expiação), que ela se tornará limpa. Essas temáticas são muito caras para a teologia, pois pressupõe uma analise progressiva no que diz respeito ao seu amplo significado.
No AT a expiação é a libertação de uma vida condenada à morte. Como no AT não aceitava sacrifício humano, colocava-se o animal no lugar do condenado. René Girard critica essa pratica dizendo que a expiação está presente em muitas religiões e afirma que o sacrifício é violento e injusto. É daí que vem a solidariedade situada, aplicada em Jesus de Nazaré, que foi solidário com a situação de opressão, de injustiça em relação à humanidade. Ele dá a sua vida, se entrega “em nosso lugar” “por nossa causa”, superando essa idéia, essa prática sacrificial. 

Em Paulo, o “em nosso lugar” é fruto da participação ativa de Jesus de Nazaré, fundamentada em sua opção livre diante das experiências de consolações e desolações existenciais. Na realidade Jesus de Nazaré foi morto porque os líderes de sua época reagiram covardemente, frente a sua orientação de vida. A morte de Jesus de Nazaré para Caifás, por exemplo, significou a salvação do status dos religiosos de sua época.
A sua entrega em “nosso lugar” não oferece a realização humana automática violando a sua liberdade, mas oferece a oportunidade do ser humano construir a sua eternidade, fazendo hoje a “sua entrega”. Paulo diz que Jesus Cristo libertou a humanidade para que ela pudesse assumir a sua vida.

"Nós nunca mais passaremos fome novamente” é a celebre frase que encerra o seu diário. Essa frase é um cântico de libertação e de esperança. Essa canção se relaciona com o filme, utiliza imagens, cita um pouco do enredo: o vestido rasgado, o colar destruído, a crueldade vivida, a perda de seu sapato. Há uma enorme fome de viver, de crer, trás uma linda mensagem de esperança. Mas há também uma enorme luta por sobrevivência.


A bastarda cai, se desespera e se perde. Numa espécie de síntese há uma necessidade de retorno, ela volta para o aconchego de seu lar, se volta para o que há de mais íntimo na sua vida. Esse retorno, assim como a sua libertação exige muito dela. Há uma finalização muito diferenciada, distanciada em relação ao filme: a bastarda perde o sapato, parece reencontrá-lo, o veste repleto de sangue, mas perde o que há de mais precioso, ela perde o seu amado brutalmente, perde a guarda de sua filha e se perde também. Não ocorre um “final feliz” como nos contos infantis, como no filme.

Ela tenta alçar novos vôos, mas logo cai. Como a imagem do pássaro que aprender a voar, onde a “mãe pássaro”, dá um empurrãozinho. A fênix renasce, aprende a ultrapassar os absurdos percorridos em sua trajetória de vida.



Ela sobrevive ao fogo, ao inferno, a dor, as perdas, as humilhações, ao opositor e a sua própria “incredulidade”. Agora é hora de tomar coragem, de se posicionar custe o que custar. Há um acerto de contas, a bastarda depois desse tufão, tem um encontro pessoal com o que há de mais valioso no ser humano: ela se encontra consigo, com suas ambigüidades, fragilidades, contradições e de forma criativa, se trans-forma, trans-cende, re-nasce. 


"Cinderella” narra à história de uma jovem (“a bastarda”), que também tem presente em seu histórico de vida perdas e desejos de superação. O filme começa com três notícias abruptas: a morte de sua mãe, um novo relacionamento afetivo de seu pai e posteriormente o falecimento de seu pai.

Ela passa a viver com a sua madrasta (“o opositor”) e com duas filhas dela de outro relacionamento. Nesse ínterim ela é obrigada a ser empregada em seu próprio lar. Cinderella se refugia no sótão de sua casa tendo como companhia alguns ratos que lá também se refugiam de um gato.

É dado um anúncio onde o Rei (“o amado”) realizará um baile para que ele possa escolher uma esposa. Cinderella se anima com a notícia e pede a sua madrasta que também possa fazer parte desse baile, ela não a proíbe, mas coloca empecilhos. O trabalho de Cinderella é redobrado tanto pelo fato de ter que arrumar a casa, quanto pelo fato de ter que confeccionar a sua própria roupa. Ele se desdobra e consegue cumprir essas tarefas, mas a madrasta e suas duas filhas destroem o seu vestido, dessa forma ficando impossibilitada de participar do baile.
Inusitadamente aparece uma fada madrinha (“o Resgatador”), que se pôs a ajudá-la. Mas lhe fez uma admoestação: Cinderella deveria chegar antes da meia-noite e a aconselhou que não deixasse de acreditar, de sonhar. Cinderella corre contra o tempo e vai ao encontro desse sonho: se casar com um príncipe encantado de um reino encantado, diferente de sua realidade dura e injusta.
O príncipe insatisfeito quase no fim do baile avista Cinderella e a convida para dançar. A madrasta e suas duas filhas ficaram se perguntando da onde teria vindo àquela linda pretendente. Cinderela e o príncipe dançaram, conversaram e se apaixonaram.
A meia-noite o relógio badala as doze batidas, Cinderela desesperada saiu correndo pela escadaria do Castelo e acaba deixando um de seus sapatos. O príncipe ficou atônito sem saber o que teria ocorrido. Então tiveram a idéia para que se encontrasse a dona daquele sapato. De porta em porta se procurava a dona. Até que finalmente batem em sua porta.


A madrasta a tranca no sótão, para que suas duas filhas pudessem tomar o seu lugar, mas o sapato não entrava em seus pés. Os seus amigos a ajudam, tomando a chave da madrasta e abrindo a porta do sótão. Cinderella experimenta o sapato, mas o sapato escorrega e quebra por ser de cristal. Por sorte ela tinha o outro par guardado. O interessante é que foi através desse par que Cinderella recebeu graciosamente uma nova chance, contrariando a admoestação da fada madrinha. Numa esplêndida cerimônia, ambos se casam e o filme anuncia um final feliz de resistência apaixonada diante da vida em relação à Cinderella.



"Nobody's Daughter" - Uma Leitura Teológica


Para fazermos essa leitura serão utilizadas as intuições deixadas pelo Teólogo brasileiro Mario de França Miranda [1], que faz uma interpretação do Teólogo alemão Karl Rahner (1904- 1984). Rahner enfatiza que a experiência da graça se dá no mais rasteiro de nossa vida, isto é, nas consolações e desolações existenciais. E pelo Teólogo brasileiro Leonardo Boff [2], que afirma que o ser humano nasce inteiro, mas não está pronto, não está pronto porque se encontra ainda em gênese. Em conjunto pretendo incluir como vimos acima, o “Diário Existencial de Courtney Love” e o filme “Cinderella”, que a meu ver se articulam e podem ser interpretados  pela teologia contemporânea.
De início vemos que é iniciativa de Deus se revelar ao ser humano, sem amarras. Se comunica sem mediação de qualquer objeto, atraindo assim o ser humano ao amor de sua divina Majestade.  São nas experiências de consolações e desolações existenciais, que o ser humano na sua liberdade tem a possibilidade de acolher ou de se fechar, de se sintonizar e intensificar ou de enfraquecer e obscurecer o dinamismo de transcendência. Dessa forma o ser humano experimenta em sua transcendência a autocomunicação de Deus como Mistério tornado próximo.
A Revelação é uma auto-manifestação de Deus, é uma auto-revelação e essa auto-comunicação de Deus vem ao encontro da abertura ou receptividade humana que está à procura e à espera de uma resposta válida e coerente para suas perguntas sobre o ser e a vida. Quanto mais o ser humano se coloca questões fundamentais e se aprofunda na experiência da vida ou utiliza seus conhecimentos científicos, mais se adentra no Mistério: “Mistério que chamamos Deus”.
O ser humano ao entrar em contato com o outro, nesse dinamismo, nesse encontro o próprio espírito humano, o faz ultrapassar em direção a um horizonte infinito. Este horizonte não é conhecido em si, mas o indivíduo tem dele certa consciência no próprio ato de conhecer o outro finito. O ser humano é o único ser, que se pergunta sobre o Mistério e o sentido da existência e do ser. Por ser espírito, o homem está receptivo e a procura de uma explicação para o Mistério. O ser humano contém um a priori cognoscitivo para uma possível revelação divina.
O mesmo poderia ser dito de cada ato humano de liberdade. O dinamismo da vontade o leva a ultrapassar em direção a um horizonte infinito inalcançável e jamais objetivável. O dinamismo que habita o espírito humano em direção ao horizonte infinito lhe permite conhecer e querer, nos permite experimentar como mistério inalcançável, presente e ausente, próximo e distante.
As experiências mais anônimas e cotidianas do Espírito Santo podem acontecer sempre que, em determinadas situações, a grandeza, o esplendor, a bondade, a beleza ou a transparência da experiência humana nos remetam confiantes à luz e à vida eterna. Em geral são situações que quebram nossos quadros familiares, deixando-nos impotentes e mudos diante da insensatez, da injustiça, do vazio, do sofrimento e da morte. O ponto alto dessa experiência se dá no momento da morte, quando não temos mais onde agarrar, nem alguém para nos socorrer, quando então nos entregamos confiante ao Mistério último como Mistério de amor e de misericórdia.
Agora iremos ver alguns acenos deixados por Leonardo Boff. Acenos que remetem o ser humano na sua inteireza e na sua incompletude. Ele afirma que para o ser humano sobreviver e se desenvolver precisa abrir-se para o outro e para o mundo, intervir no meio, trabalhar e fazer cultura. Mas não se limita estar aberto apenas a isso e àquilo, mas é possível estar aberto também à totalidade.
Também afirma que nada do que ele encontra no seu vagar pela realidade o preenche e satisfaz. Na realidade o ser humano é um ser desejante. A estrutura do desejo é a ilimitação e a negação de todo o interdito. O ser humano como ser desejante não encontra no mundo nenhum objeto que lhe satisfaça totalmente o desejo. Por isso, se recusa a aceitar o mundo assim como o encontra. Tentando saciar o seu desejo, molda, pela liberdade, a si e ao que o cerca e vai construindo a sua existência, feita e sempre a fazer.
Só o ser humano pode se tornar um ser trágico, pois, somente ele é capaz de fazer a experiência do poeta: ‘A maior dor é não poder dar amor a quem se ama’(Tiago de Mello), porque não há correspondência no amor. O ser humano além de ser trágico é ontologicamente, infeliz. Não há psicanálise que o possa curar. É um errante, irrequieto buscador de uma plenitude que lhe é negada em todas as partes.
Todos os seres possuem o seu habitat e aí vivem numa espécie de sesta biológica. O ser humano, homem e mulher, não. Ele está a caminho de uma casa que ainda não acabou de construir ou que sequer encontrou. Ele é um grito lancinante lançado ao infinito. Esse seu grito não é, porventura, eco de uma voz maior, que ressoa dentro dele e que o chama para se superar a si? 

[1] MIRANDA, Mario de França; Karl Rahner - 100 Anos, Teologia, Filosofia e Experiência Espiritual; Edições Loyola, São Paulo, Brasil, 2005; pp. 35-50.
 
[2] MURARO, Rose Marie e Leonardo Boff; Feminino e Masculino: Uma Nova Consciência para o Encontro das Diferenças; Rio de Janeiro: Record, 2010; pp. 63-78.